O BARBEIRO 'FRESCO'




António Martins Mortal (1878-1943)


Entre os cidadãos seus contemporâneos, sempre foi tratado pelo nome de “barbeiro Fresco”.
Poderá ter sido o primeiro mestre barbeiro com loja aberta em Pinhal Novo?
No seu espólio, foi encontrado um livro de contas, com o título: 
«Caderno de Contas gerais de 1904». Nesse livro pode ler-se:
“Em 1901 em 8 de Dezembro foi o primeiro dia em que comecei a fazer barbas no Pinhal Novo com loja de barbeiro, com mobília e ferramentas que importou em 43660 réis”. 
Esse dia 8 de Dezembro de 1901, coincidiu com o segundo domingo do mês, portanto domingo de mercado, um excelente dia para iniciar o seu trabalho de barbeiro. 
E continuemos a ler o Caderno de contas: 
“Em 1903 foi colocado o aparador que importou em rs.: Pedra 1000, Caixote 1200, Caminhos-de-ferro 390, Madeira 5200, Consolas ou extensões 1000, fechaduras e pingente 1120, Verniz 2,80, Pregar Fechaduras 300, Mão dobra 5950 e Sedeto ou Guarda-chaves 200”.

Tinha a sua loja de barbeiro nas casas laterais da capela, no lado sul, na época em que aí esteve instalada uma farmácia. 
Não abriria a loja todos os dias, porque certamente os fregueses não eram tantos que pudessem preencher um dia de trabalho e, o negócio não daria para o sustento da família. Seria aos “fins-de-semana”, sábados e também domingos de mercado, que a afluência de clientes seria maior.


  Não se podia “confiar”


 Interessante testemunho de que se reproduz cópia, e que esteve afixado algures na loja de barbeiro

Era um cartaz, que se iniciava com a assinatura de António Martins Mortal e onde se podia ler que o barbeiro, 

“Faz saber a todos os Exmos Snr. Fregueses e Clientes:
Que d’ora avante não confio barbas pois considero triste vir o freguez para o barbeiro lhe cortar a barba e deixar ficar a cara empenhada por tão insignificante quantia.
Pinhal Novo, 22 de Dezembro de 1906”.

Apesar de todas estas cautelas sobre o pagamento do seu trabalho de barbeiro, podemos encontrar no seu espólio uma folha onde está escrito:
“Tenho dinheiro perdido que já não tenho esperança de receber…até 25 de Dezembro de 1910, Réis 192:680”.
Certamente que aos domingos de mercado teria que suportar a concorrência de um ou outro barbeiro que nesses dias sempre montavam tenda no Arraial.
Hoje, é possível ouvir aos habitantes menos jovens desta terra, histórias sobre o “barbeiro Fresco”.


Contam esses mesmos habitantes, que as conversas sempre acabavam com a sua imagem de marca, da qual o “barbeiro Fresco” se orgulhava e não deixava que pusessem minimamente em causa.

Comparava a sua destreza no ofício, com a velocidade de um comboio a entrar na estação de Pinhal Novo.
Com a sua prosápia, dizia:

«O freguês senta-se na cadeira quando o comboio está a 'pisar' a passagem de nível ao quilómetro 16. Quando o comboio pára na estação já o freguês tem a barba desfeita».

A passagem de nível ao quilómetro 16, ficava a nascente da estação, “atravessava” as vias-férreas do ramal de Setúbal e também a linha do Alentejo, que ia para Vendas Novas. (Hoje, essa antiga passagem de nível foi substituída por um viaduto).
Na data em que o “barbeiro Fresco” tinha a sua loja nas casas da capela, a distância entre a passagem de nível ao quilómetro 16 e a estação, era de cerca de 530 metros.
A família dos Frescos
Ao procurar saber junto de pessoas com muitos anos de Pinhal Novo, quem teria sido este barbeiro conhecido por “Fresco”, não encontrava indícios que elucidassem sobre o seu ramo familiar. Também nos documentos consultados não aparecia alguém com este apelido que tivesse desempenhado a profissão de barbeiro.
Existem muitas referências de que há longos anos, desde o início do século XIX, uma ou mais famílias vinda das bandas da Gândara com apelido de Fresco se instalaram aqui pelos nossos sítios. Muitos elementos dessas famílias estavam dispersos pelas zonas de Sarilhos, Moita, Abreu Grande, Penteado, Carregueira, mas não se encontrava nas profissões desempenhadas pelos Frescos que íamos pesquisando, alguém com a profissão de barbeiro.
Eram agricultores, trabalhadores, proprietários, ferroviários, … mas com a ocupação de barbeiro, não aparecia cidadão algum.

Certa vez, consultando as escrituras que permitiram o senhorio das terras que haviam sido alugadas por José Maria dos Santos, encontrei referenciado no livro de notas nº 429 para actos e contractos entre vivos, a folhas trinta verso. (do tabelião Pereira Godinho)
SAIBAM… (que no ano de 1914 aos vinte e oito de Dezembro)… (e da outra parte o senhor António Martins Mortal, casado, proprietário e barbeiro, morador na Cascalheira)…


A família do barbeiro “Fresco”
Na posse dos dados encontrados, procurei quem pudesse corroborar a informação. Foi-me indicada uma senhora, natural de Pinhal Novo que seria, segundo a informação, filha do “barbeiro Fresco”.
Tive oportunidade de falar com a senhora Luísa Gertrudes Martins Fernandes, a sua filha, que me confirmou que seu pai era realmente conhecido pelo “barbeiro Fresco”.

“Que tinha a barbearia nas casas da capela e que também se ocupava das terras que cultivava”.
Com esta informação, que ajudou a confirmar a fonte encontrada no registo de doações, o caminho ficou “aberto”. Depois foi necessário pesquisar para conseguir encontrar o motivo porque era conhecido por Fresco, sendo de apelido Mortal.

Quem foi este barbeiro “Fresco”?

O seu verdadeiro nome, como já se leu, era António Martins Mortal.
Nasceu no sítio da Cascalheira no dia 2 de Novembro do ano de 1878.
Os seus pais foram; José Martins Mortal (1836-1885), um trabalhador rural, natural da freguesia de Nossa Senhora das Febres que se fixou na zona do Abreu e aí conheceu Maria de Jesus (1848-1938) com quem casou em 3 de Novembro de 1866.
O apelido Fresco, pelo qual era conhecido o nosso barbeiro, vinha da parte materna. Sua mãe, Maria de Jesus, foi filha de João de Oliveira Fresco (1814-1906) e de Sebastiana Jorge (1815-1885) oriundos das terras da Gândara, mais precisamente de São Tomé de Mira, Aveiro.
Foi por esse motivo, que o senhor António, que também era Mortal, ficou sempre conhecido pelo apelido de seu avô materno, Fresco.
Para terminar, quero deixar os meus agradecimentos ao Rogério e ao Rui, netos do nosso barbeiro ‘Fresco’. 
Caderno de contas Gerais   


    José Manuel Cebola,Agosto2015









5 comentários:

  1. Existem certezas quanto á data de nascimento de Sebastiana Jorge, e freguesia onde nasceu ? Uma vez que esta era filha de Francisco Delgadinho, natural da Tocha, seria suposto ser tambem natural da Tocha e não de São Tomé de Mira. Contudo não encontro o seu assento de nascimento no ano de 1815.

    Cumprimentos
    João Delgadinho

    ResponderEliminar
  2. Não há certezas quanto ao nascimento de Sebastiana Jorge. A possível data de nascimento, foi baseada na data do óbito, e na idade anotada que Sebastiana teria em 1885...Quanto à naturalidade, foi nascida em Tocha o erro foi ter anotado o local de nascimento do marido João de Oliveira Fresco ele sim, natural de S.Tomé de Mira. Não desisti de tentar encontrar a data. Obrigado pelo reparo.

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Sebastiana Jorge era natural da Caniceira (Cantanhede) e era irmã do meu trisavô, José Alves Delgado. O Barbeiro Fresco era neto dela.

      Eliminar
  3. Sebastiana Jorge, nasceu a 24 de Maio de 1814, no lugar de Caniceira e foi baptizada na capela de N.S. da Tocha, a 30 de Maio.
    Livro de Baptismos de Tocha, refª CNT14-002-0004-m0088 tif.

    ResponderEliminar
  4. Paulo Parreira, e como o mundo é pequenio, Sebastiana Jorge teve um filho, Jose de Oliveira Fresco, que foi casar a...Santiago do Cacem, onde teve uma filha, Luisa de Oliveira de fresco...que foi avó de João Ramos Camolas, advogado em Setubal

    Cumprimentos
    João Delgadinho

    ResponderEliminar